sábado, 25 de abril de 2015

poemorfose n.11

Meu giz
de cera vermelha quebrou
-quebrou, eu emprestei, gastou,
o que importa?- quebrou.
Morfeu, adormecido, aqui ao meu lado
sonha que perdeu a letra que lhe dá forma.
M
orfeu agora
quase sempre
canta. Unge sua garganta com mel
e pastilhas; enche a cara...
Orfeu agora
quase nem
sonha. Nutre-se do leite azul
das bacantes; rememora:
um coração que bate
junto a um coração que para;
um pedaço de carvão, uma lasca,
um gume ou a ponta, uma brasa;
na pele rabiscada de poemas,
um poema rasga a pele,
arranha fundo e raspa uma letra
assustada.
Orfeu agora
grita. Debate em si sua existência,
devora a letra, aceita-a, reforma-se.
M
orfeu, acordado, aqui ao meu lado,
escorre seu dedo por minhas costas.
Morfeu só escreve em vermelho,
mas meu giz quebrou ou
emprestei ou gastou...
Então Morfeu me arranha
cava em minha pele meu próprio giz
e rabisca
um poema roubado:
"Espirales en descenso. Roto el sueño
queda el desierto. La arena ruge,
el cielo se desata. Hasta la luna llora
ante tal silencio."



(Interferência de Matheus Passos)

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